Marcas e Empresas
Empresas que 'clonam' negócios internacionais enfrentam desafios
Em março, Dan Strougo, 31, ficou aflito ao saber que o site australiano 99designs, no qual havia se inspirado largamente para criar a sua empresa, a LogoChef, estava se preparando para atuar no Brasil.
Ambos os sites fazem a mesma coisa: permitem que designers disputem para fazer trabalhos free-lance para empresas. Mas o internacional é o mais conhecido desse tipo no mundo, com mais de 245 mil artistas cadastrados --a versão brasileira tinha quase cem vezes menos.
"Eu sabia que, quando eles chegassem, ia ficar complicado, por causa do poder deles", conta Strougo.
O empresário decidiu entrar em contato com os australianos para tentar uma parceria. A LogoChef acabou sendo comprada pela 99designs e Strougo vai dirigir a operação brasileira, inaugurada na semana passada.
Um dos meios mais usados pelos empreendedores digitais brasileiros para criar seus negócios é a prática do "copycat", copiar um modelo que dá certo internacionalmente e aplicá-lo aqui. Isso pode reduzir os riscos do negócio, já que a ideia já foi testada, mas não é garantia de sucesso.
Para Nicolas Gautier, diretor da empresa de investimentos Bolt Ventures, fazer um "copycat", em vez de apostar em uma ideia original, pode deixar a empresa mais vulnerável. Outros empreendedores podem implementar o mesmo projeto facilmente, fazendo com que vários concorrentes surjam ao mesmo tempo.
"Quando você faz uma cópia, não cria barreiras para que outras empresas não entrem no seu mercado", afirma Gautier.
Depois de investir em alguns clones no país, a Bolt diz que vai abandonar a prática.
"Acredito em uma segunda onda de start-ups [empresa iniciante de tecnologia], que resolvem problemas brasileiros e precisam de soluções brasileiras", diz Gautier.
CONHECIMENTO DO NEGÓCIO
A questão é controversa. Rodrigo Sampaio, 35, presidente-executivo da empresa de investimento Rocket Internet, diz que em casos como o comércio virtual existem vantagens em copiar uma ideia internacional --esses são negócios que exigem muito conhecimento de como funciona o mercado local.
"Se um competidor externo [de e-commerce] quiser entrar no Brasil, vai precisar de equipe, armazém, contatos, compradores. É mais difícil de replicar", diz.
Marcelo Marques, 32, fundador da loja virtual de móveis Mobly, que tomou como base a americana Wayfair e a alemã Home24, aposta nisso frente a uma possível concorrente. "Um competidor grande precisaria gastar muito para chegar ao nosso estágio."
Ele abriu a loja no ano passado e já recebeu três rodadas de investimento --a última, de US$ 10 milhões, veio do fundo da família Cisneiros.
Marques afirma que fez ajustes na oferta dos produtos, apostando na quantidade: são 50 mil itens à venda. "Na Alemanha, o mercado é altamente competitivo. Eles não se preocupam tanto com o sortimento, mas, sim, com a qualidade."
EQUAÇÃO ERRADA
A falta de adequação da estratégia à realidade do país é apontada como uma das causas da falência da Shoes4you, um clone brasileiro da americana ShoeDazzle, de comercialização de calçados por assinatura.
"Fizemos um 'copycat' da estratégia e dos preços de lá sem que isso fosse aplicável no Brasil", diz Olivier Grinda, 28, fundador do serviço.
Ele afirma que a empresa cobrava uma assinatura de R$ 100, enquanto os americanos trabalham com algo em torno de R$ 70, mas tinha margem de lucro menor, em razão de custos maiores como o de logística.
"Se eu tivesse subido o preço para R$ 200, não teria clientes suficientes para pagar a operação. A equação para esse serviço de assinatura não funciona hoje no Brasil."
Também é preciso se comunicar com o público de forma diferente. Olivier Raussin, 38, presidente-executivo da empresa de investimentos Project A, conta que, na hora de montar o Epicerie, a versão brasileira de um site de venda de vinhos que já funcionava na Alemanha, foi necessário adaptar o conteúdo.
"Os brasileiros não são tão conhecedores do vinho, então tivemos de situar a bebida na vida das pessoas: no churrasco, em um jantar romântico, na Copa Libertadores", diz.
Eldes Mattiuzzo, 45, fundador da plataforma de contratação de seguros pela internet Bidu, afirma que sua empresa é mais didática do que os três negócios internacionais nos quais se inspirou.
De acordo com Mattiuzzo, os estrangeiros são mais diretos na venda. "Antes de falar da transação e de promoções, precisamos fazer um processo de educação e explicar por que o cliente precisa fazer um seguro, algo que não é necessário em mercados maduros."
Inspirar-se inicialmente em modelo internacional não implica ficar preso a ele. Vitor de Mesquita, 29, fundador do Locamob, uma plataforma que permite que os internautas analisem locais que já visitaram, tirou a ideia do americano Yelp (que abriu a operação brasileira há duas semanas).
Ele diz que sua empresa passou de "90% copycat" para 20%. O Locamob tira a maior parte de seu faturamento de assinaturas das empresas que querem destaque na página, em vez de publicidade comum.
"Com esse plano, os comerciantes ganham um site com seus dados de localização e de contato, caso não tenham presença na internet", diz Mesquita. O objetivo é atender um público que ainda carece de soluções digitais --o dos pequenos e médios negócios. "Queremos pegar gente que nem está on-line, convertê-los e cuidar deles." Por FELIPE MAIA EDITOR-ADJUNTO DE "CARREIRAS" MARCEL GUGONI
Editoria de Arte/Folhapress
Fonte: Folha de SP 01/09/2013
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