eSocial já afeta o dia a dia das empresas brasileiras
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eSocial já afeta o dia a dia das empresas brasileiras


Sistema que unifica envio de dados dos funcionários das empresas ao governo só entra em vigor dentro de ao menos um ano, mas já mobiliza as empresas

Um trabalho de formiguinha está em curso na Pfaudler, fabricante de equipamentos para indústrias farmacêuticas e químicas. O enxuto setor de Recursos Humanos, com apenas três pessoas, separa alguns dias da semana para atualizar o cadastro dos funcionários. Como possui uma equipe de 110 pessoas, é um esforço que só estará finalizado dentro de oito a dez meses, calcula Cristina Melo, supervisora de RH da empresa situada em Taubaté, São Paulo.

Em Castanhal, no interior do Pará, a empresa que leva o nome da cidade está empenhada, desde abril, no "saneamento" da ficha dos cerca de 800 empregados. A fabricante da fibra têxtil juta, cujo uso vai do artesanato ao trivial saco de batata, tenta tapar o buraco das informações que faltam ou não foram atualizadas ao longo dos anos e, para isso, contratou cinco funcionários extras. Em softwares, R$ 80 mil já foram investidos e a conta deve dobrar até o fim do processo, estima Hélio Junqueira Meirelles, diretor da empresa.

Uma sigla explica essa corrida para organizar a casa: eSocial, diminutivo para Sistema de Escrituração Digital das Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas. O projeto vai transformar o envio de informações das empresas sobre seus funcionários ao governo numa espécie de "big brother".

Quando estiver em pleno funcionamento, alguns dados terão de ser informados quase que em tempo real, como é o caso de admissão ou demissão de funcionário. Na prática, esse prazo já é exigido pela legislação hoje. A diferença é que, atualmente, a empresa que descumpre as regras só é punida quando há fiscalização. Com o eSocial, essa checagem será automática. "O eSocial não cria nenhuma nova obrigação, ele só unifica as informações que já são prestadas de maneira pulverizada.", afirma Marcelo Ferreira, supervisor tributário da empresa Easy-Way, que desenvolve softwares tributários, fiscais e contábeis

Cadastro. A atenção ao cadastro dos funcionários ocorre porque essa é uma das principais mudanças exigidas pelo eSocial. Dados até então não solicitados passarão a ser exigidos. Na lista, entram informações sobre os dependentes do funcionário ou se o empregado possui casa própria, por exemplo.

Também será preciso eliminar duplicidades e erros em informações como o número do CPF, da carteira de trabalho e a data de nascimento. Isso porque o eSocial vai facilitar o cruzamento de dados entre os órgãos envolvidos no projeto (Ministério do Trabalho, Previdência Social, INSS, Receita Federal e Caixa Econômica Federal, representando o Conselho Curador do FGTS).

Em geral, as empresas têm reclamado dos custos para adequação e da grande quantidade de exigências. O governo se defende dizendo que o eSocial vai simplificar processos e facilitar o controle e fiscalização de informações. Hoje, um mesmo dado é enviado a diversos órgãos. Ao unificar tudo em um sistema, a promessa é facilitar, no longo prazo, a prestação de contas. Mas isso não quer dizer que o processo será indolor para as empresas.

Na seguradora Tokio Marine, com 1.605 funcionários, o mais difícil até agora foi entender o que era esse novo sistema. "As informações sobre o eSocial chegavam por diversas fontes e nunca de uma maneira totalmente completa. Isso gerou um certo medo no começo", afirma a diretora da RH da empresa, Juliana Zan. Uma carga adicional de incerteza ocorreu por conta das sucessivas mudanças de cronograma. "Mas confesso que tínhamos um alívio sempre que víamos que o eSocial tinha sido adiado de novo", diz Juliana.

De acordo com o cronograma do governo, o eSocial só deve estar funcionando pra valer dentro de um ano. Ainda falta a publicação, prevista para outubro, de um manual final com todas as obrigações que serão exigidas. Seis meses após isso, haverá um período de testes e, depois de mais seis meses, começa a obrigatoriedade. Nessa primeira etapa, entram apenas as grandes e médias empresas, com faturamento superior a R$ 3,6 milhões. Hoje, cerca de 1 milhão de empresas brasileiras se enquadram nessa situação, segundo a Receita Federal.

No futuro, as empresas de pequeno porte também devem entrar no eSocial, mas não há previsão para isso ainda. O certo é que as exigências serão menores.

Pouco conhecido. No Estado do Rio de Janeiro, uma pesquisa realizada pela Fecomércio/RJ e o Instituto GPP em maio concluiu que, entre 400 empresários, apenas 7,5% conhecem o eSocial. Destes, 16,7% afirmaram conhecer os prazos e 23,3% foram orientados por seus contadores sobre o projeto.

A maioria dos entrevistados (76,6%) afirmou não saber quais são os reais benefícios do eSocial. Para 16,6%, o sistema trará redução de custos, enquanto 3,3% enxergam redução da burocracia. Outros 6,7% não enxergam nenhum benefício. Essa etapa do levantamento admitia mais de uma resposta e era espontânea.

Dificuldades. Na Tokio Marine, um desafio extra foi entender como lidar com os corretores. Isso porque eles vendem os seguros, mas não são funcionários diretos da empresa. "Os corretores são parceiros de negócio e dependendo do contrato podem ser autônomos", diz. A solução foi criar um sistema para que as informações cadastrais fossem atualizadas. Ela estará disponível primeiro para os funcionários "próprios" e depois para os corretores.

A Tokio Marine ainda precisou da ajuda de outras empresas do setor para esmiuçar os detalhes do eSocial. "Nós já temos um grupo dos setores de RH das empresas de seguro onde discutimos questões frequentemente e criamos um sub grupo para discutir essa questões sobre o eSocial. Agora, que entendemos melhor o projeto, não parece um bicho de sete cabeças", diz. Além disso, um grupo interno de discussão, envolvendo diversas áreas da empresa, também foi implementado.

Agora, a Tokio Marine se prepara para comprar um novo software, com custo estimado de R$ 50 mil. Além disso, o programa prevê um gasto variável todos os meses, que pode chegar a R$ 20 mil

Custos. Para empresas de menor porte e com o setor de RH menos estruturado, os desafios tendem a ser maiores. Na Castanhal, a queixa é grande. "O governo quer aproveitar essa ferramenta para pegar uma série de dados que não deveriam ser parte da relação trabalhador e empresa. Vamos acabar fazendo todo o trabalho de informação do funcionalismo para o governo", afirma Meirelles, diretor da empresa. Para ele, os gastos com tecnologia e horas trabalhadas deveriam vir acompanhados de alguma compensação fiscal por parte do governo. "O banco de dados vai aumentar em mais ou menos 40% o volume de informações. Então será preciso trocar computadores, por exemplo", afirma.

Apesar das dificuldades na adequação, na Pflauder a ideia de implementação do sistema foi bem recebida por trazer uma perspectiva de igualar a competitividade entre as empresas. "Escuto muitas críticas, mas como funcionária de RH confesso que fico feliz com essa nova exigência. É difícil concorrer em termos de preço com empresas que não cumprem e pagam 100% das exigências trabalhistas", diz Cristina.  Por Hugo Passarelli, estadao | Leia mais em estadao.msn 24/09/2014



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