Marcas e Empresas
Fábrica de sócios
Com um modelo baseado em fusões com varejistas regionais, a Máquina de Vendas se tornou a maior rede de lojas do País.
O empresário carioca radicado na Bahia Luiz Carlos Batista presidente do conselho da rede varejista Máquina de Vendas, investe muito tempo no relacionamento com seus sócios. Há dois anos, ele faz reuniões mensais em Salvador com o mineiro Ricardo Nunes, da Ricardo Eletro, com quem criou a rede, em março de 2010, depois da fusão com a Insinuante. Participa também desse encontro o mato-grossense Erivelto Gasquez, da City Lar, comprada em junho do mesmo ano.
Nas chamadas “reuniões 360 graus”, todos discutem resultados e estratégias. No ano passado, incorporou-se ao grupo o pernambucano Richard Saunders, da Eletro Shopping. Batista faz questão de hospedar todos em sua casa e se esforça para criar um clima familiar. “Viajamos juntos nas férias, as famílias se dão bem e viramos amigos”, diz Batista.
A grande família: 1. Ricardo Nunes, da Ricardo Eletro; 2. Luiz Carlos Batista, da Insinuante; 3. Richard Saunders, da Eletro Shopping; 4. Clayton Salfer, da Salfer; 5. Cláudio Salfer, da Salfer; 6. Erivelto Gasquez, da City Lar. Na última viagem da turma, para Milão, na segunda quinzena de abril, saborearam bons vinhos italianos juntos. Pouco depois, o clube aumentou: os catarinenses Clayton e Cláudio Salfer tornaram-se o quarto e quinto sócios de Batista. Em 26 de abril, os dois irmãos venderam 55% da rede que leva o sobrenome da família ao grupo varejista.
Manter tanta gente contente ao mesmo tempo é um dos desafios da agressiva estratégia de expansão arquitetada por Batista e Nunes. A Máquina de Vendas compra participações majoritárias em redes regionais, mas mantém seus fundadores à frente da operação das bandeiras que criaram. Até agora, essa tática deu certo. Em dois anos de existência, a Máquina de Vendas se tornou, com a compra da Salfer, a maior rede de eletroeletrônicos do País em número de lojas.
São mais de 1,1 mil pontos distribuídos por todo o País (à exceção de São Paulo, que é atendido apenas pelas vendas online). Nesse curto espaço de tempo, o faturamento da rede saltou 50% e deve superar os R$ 8 bilhões neste ano. Em receita, está atrás apenas da Viavarejo, do grupo Pão de Açúcar, mas à frente do Magazine Luiza (confira gráfico ao final da reportagem).
Esse crescimento acelerado foi conseguido com um desembolso de caixa muito menor do que se Batista e Nunes tivessem optado por aquisições simples ou crescimento orgânico, ampliando a rede original. Mas será que ter tantos sócios não pode ser um problema? Batista acredita que não. “Acho que é uma vantagem”, diz o empresário. “Eles conhecem bem os mercados regionais e as marcas têm uma tradição que não conseguiríamos criar rapidamente.”
A falta de conhecimento das peculiaridades dos consumidores de eletroeletrônicos em cada região do País já provocou prejuízos a grandes redes, lembra o diretor da consultoria Alvarez & Marsal, Eduardo Seixas. “O Brasil é um continente e há diferenças regionais muito grandes”, diz. Seixas cita, por exemplo, a tentativa frustrada da Casas Bahia, tradicional em São Paulo, de operar no Sul.
Valorizando o conhecimento local, a Máquina de Vendas dá liberdade aos fundadores das companhias adquiridas. “Não tratamos as redes regionais como subsidiárias, mas como sócias”, afirma Nunes, CEO da Máquina de Vendas.
Essa estratégia facilita convencer os empresários regionais, com administrações familiares, a fechar negócio com a Máquina. Muitos de seus controladores são jovens, na faixa dos 40 anos, que estão em plena atividade e não admitiriam sair da linha de frente das operações.
O empresário Richard Saunders, 39 anos, fundador da Eletro Shopping, é um exemplo. “Eu não queria abrir mão da empresa e o modelo proposto me pareceu ótimo”, afirma. Clayton Salfer, que nunca ambicionou criar uma rede nacional, fechou negócio com a Máquina de Vendas para ganhar competitividade. “O que nos atraiu foi a possibilidade de integrar um grande grupo que permite uma administração local”, diz o empresário.
O modelo, no entanto, tem limites. Batista admite que vai ser difícil que o clube de sócios ganhe novos integrantes. “Já estamos em todo o País, o importante agora é obter os ganhos de sinergia e melhorar a rentabilidade”, diz o presidente do conselho. A redução de custos num modelo que preserva administrações independentes é naturalmente menor do que numa aquisição tradicional.
Pelos contratos firmados nas associações, as redes incorporadas integram seus sistemas de informática e começam aos poucos a usar o centro de serviços compartilhados que fica em Belo Horizonte. Com isso, cortam custos nas áreas jurídica, contábil e fiscal.
Uma das principais vantagens é a força que um grupo maior tem na hora da negociação de preços com os fornecedores. Essa missão fica a cargo de Nunes, conhecido pela obsessão em cobrir as ofertas dos concorrentes.
Mas as redes mantêm liberdade para escolher o mix de produtos de suas lojas e desenvolver estratégias comerciais e de marketing. Batista calcula que o grupo economize algo próximo de 5% do faturamento bruto, ou cerca de R$ 400 milhões por ano.
Embora a estratégia de expansão tenha dado resultado, o maior desafio da Máquina de Vendas começa agora. “A grande incógnita é o que a empresa fará em termos operacionais”, afirma o consultor Eugênio Foganholo, dono da consultoria Mixxer, de São Paulo. “Por enquanto, o foco não parece estar na melhora da eficiência.”
Num setor de margens baixíssimas, isso é fundamental para gerar lucro. Como a Máquina só publicará o balanço no ano que vem, não há dados que permitam comparar sua eficiência com a dos concorrentes. Tampouco está nos planos imediatos dos contraladores levar a varejista para a bolsa, em razão do cenário turbulento no mercado financeiro. Batista e Nunes, no entanto, seguem preparando a companhia para um IPO no futuro.
Há dúvidas se a estrutura societária de uma holding, com participações diferentes e administrações independentes, não confundiria os investidores. Os empresários argumentam que os sócios fazem um trabalho melhor do que fariam os executivos. É verdade que já há companhias de capital aberto com modelos semelhantes, como a BR Pharma, rede de farmácias construída pelo BTG Pactual.
Outro desafio, esse ainda distante, será a discussão da sucessão em cinco famílias diferentes. Hoje todos os sócios são jovens e têm filhos pequenos. Tanto Batista quanto Nunes acreditam que a tendência no futuro será profissionalizar o grupo, reservando o conselho de administração para as famílias. Mas se isso não provocará disputas no futuro ainda é difícil de prever. Batista ainda tem muito a investir na boa relação com os sócios.
Por Tatiana BAUTZER e Marcio ORSOLINI
Fonte: Istoedinheiro 18/05/2012
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