Marcas e Empresas
Juro de um dígito aumenta disposição a ativos de risco
A ata do Comitê de Política Monetária (Copom) divulgada na semana passada - na qual o Banco Central (BC) sinalizou que a taxa de juros pode ser de um dígito ainda neste ano - deve fazer com que os gestores de recursos de renda fixa elevem gradualmente as aplicações em papéis indexados à inflação em suas carteiras. E, no caso dos fundos multimercados, as apostas em ações também podem ser aumentadas.
Na quinta-feira, o BC deixou claro que a trajetória de queda da taxa básica de juros não ficará limitada a apenas mais um corte de 0,5 ponto percentual, como esperava parte do mercado, o que significa que o ciclo não seria interrompido em março, data da próxima reunião do Copom. Após o comunicado, alguns especialistas passaram a acreditar que, diante da disposição forte de reduzir a Selic, a meta de inflação pode ter ficado definitivamente em segundo plano.
A ata nunca foi tão explícita ao mostrar que o governo está disposto a concretizar a taxa de juros em um dígito, em contrapartida, trouxe menos conteúdo sobre a inflação, diz Mauricio Pedrosa, sócio da Queluz Asset Management. Com isso, os papéis indexados à inflação ficam mais atraentes, já que o retorno (cupom) pago pelos títulos atrelados ao IPCA devem se reduzir, beneficiando os fundos que mantêm esses ativos em carteira.
Pedrosa lembra que, nesse cenário, fica ainda mais difícil para os fundos de pensão e para as carteiras de previdência ligadas a Estados e municípios - os chamados Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS) - cumprirem suas metas atuariais de entregar retornos de IPCA mais 6%. "Eles terão de correr mais riscos, terão de carregar uma posição em bolsa para entregar resultados", afirma o sócio da Queluz.
A bolsa é um ativo que também deve ganhar atratividade para os multimercados, embora esse deva ser um movimento gradual, já que ninguém ainda está muito otimista com renda variável, afirma Rodrigo Menon, sócio da Beta Independent. Segundo ele, a grande maioria dos gestores já está posicionada apostando na queda dos juros no mercado futuro, movimento que tende a se manter.
A expectativa de redução ainda mais expressiva da taxa básica de juros brasileira tende, de fato, a estimular uma movimentação da estratégia das gestoras, afirma Fabio Anderaos, gestor da Solo Asset. Ele ressalta, no entanto, que as mudanças deverão ocorrer gradualmente. "Não devemos ver uma grande saída da renda fixa, já que o cenário é de cautela, então ninguém vai migrar de mercado de repente", diz. "A estratégia pós-Copom vai mudar um pouco, mas não no curto prazo."
Anderaos observa que as carteiras ficarão mais diversificadas, com maior inclinação a riscos, seja via mercado acionário ou de títulos privados, e menor exposição aos títulos públicos. "O gestor poderá buscar mais rendimento em investimentos como debêntures", explica ele, ressaltando que as alterações serão feitas com mais prudência.
O gestor avalia que a perspectiva para a bolsa brasileira está melhor que no fim de 2011, apesar da contínua insegurança com a Europa, e destaca que o ingresso de novas empresas no mercado de capitais deve se aquecer. "Os IPOs [oferta pública inicial de ações, na sigla em inglês] podem ter um clima melhor neste ano", comenta.
Na visão de Will Landers, gestor de portfólio para América Latina da BlackRock, a mudança da estratégia das gestoras, contudo, deve levar mais tempo que o imaginado. Para haver essa movimentação, diz ele, é necessário não apenas que os juros caiam, mas que permaneçam em níveis baixos por um período suficiente de tempo. Vale lembrar que, em junho de 2009, por exemplo, a taxa Selic caiu para 9,25%, mas, um ano depois, os dois dígitos já voltavam à cena.
Landers destaca que, considerando uma continuidade do nível baixo de juros no Brasil, aliado à perspectiva de inflação sob controle, a mudança das gestoras só deverá ser percebida somente no fim do ano ou apenas no início de 2013.
A mudança maior deverá ocorrer entre os investidores institucionais, que precisarão buscar mais retorno migrando de fundos de renda fixa para multimercados, avalia Jacob Weintraub, sócio da Oren Investimentos. Para ele, mesmo as operações que pagam taxas levemente acima do CDI, de 105% ou 106% do CDI, por exemplo, perdem a atratividade diante de um cenário de juro de um dígito, já que não trazem retornos muito maiores aos fundos.
Na visão de Weintraub, os gestores não passarão a comprar bolsa somente porque o juro está baixo e, sim, de olho no crescimento. E, nesse ponto, ele se mostra menos otimista que o mercado. Enquanto a média de mercado para o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro neste ano é de 3,3%, a gestora trabalha com 2,5%. E, nesse cenário, apostar na alta da inflação também não se mostra interessante, diz ele. "Os juros devem ficar baixos, mas a inflação se mostra mais amarrada por conta dos preços das commodities, que devem cair", afirma. A equipe da Oren aposta em mais duas quedas de 0,5 ponto percentual da Selic. Por Luciana Monteiro e Beatriz Cutait
Fonte:ValorEconômico30/01/2012
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