Artigo do Valor Econômico de um colunista da Bloomberg News, publicado em 2/03/2009.
Na onda de procurar culpados pela crise e pelas demissões em massas que estão sendo feitas, o colunista escolheu como culpado o fato das empresas divulgarem balanços trimestralmente. Isso reforçaria a cultura de curto prazo e forçaria os executivos a tomar atitudes só para “agradar” os acionistas.
Pressão de acionista vai acontecer sempre, não importa se o balanço é anual, trimestral mensal ou diário. Os mercados não se movem apenas quando saem os balanços, mas na expectativa de como serão o próximo e os próximos. Quanto menos você divulgar resultados, mas incerteza se cria, e a pressão e a queda nas ações só tendem a piorar. Por essa lógica, o Itaú e o Unibanco não deveriam ter antecipado a divulgação do balanço do terceiro trimestre, quando surgiram dúvidas sobre os bancos brasileiros. Deveria ter divulgado só o anual de 2008 e olhe lá. Não se sabe onde estariam as ações desses bancos se isso tivesse acontecido.
Os argumentos apresentados são fracos. O colunista cita como exemplo a fraude contábil da Enron. A fraude teria ocorrido independente da periodicidade de divulgação dos resultados. Cita o esquema de remuneração baseada em lucros, que incentiva os administradores a inflar os lucros para ganhar um bônus maior. Mas, o que impediria que esse administrador inflasse o lucro e ganhasse bônus se o balanço fosse apenas anual?
O esquema de remuneração baseado em lucros e as fraudes contábeis são problemas, isso não se discute. Mas a questão apresentada nada tem a ver com esses problemas. Uma abordagem para o primeiro problema é atrelar o bônus á criação de valor para o acionista (uma variável de longo prazo) e para o segundo uma maior regulação e maior vigilância dos participantes do mercado.
A coluna destaca a frase “as empresas não quiseram dividir os lucros com os empregados, mas com seus acionistas”. Além de estar totalmente deslocada, sem muito nexo com o resto do texto, essa frase não quer dizer nada. O melhor (no pior sentido) dessa frase é a confusão de conceitos que faz. O que é a empresa? Da maneira tratada no texto, ela é um ser autônomo, animado, mas sem ser uma pessoa, que vai agindo e tomando decisões baseada na vontade e nos interesses próprios. Consertando a frase que, só pelo fato de ser torta, já não merece muito crédito, deveria ser: “os acionistas não quiseram dividir os lucros com os empregados, mas ficar com os lucros para eles”. Se isso ocorreu, o problema de falta disposição para gastar não existiria, já que certas pessoas físicas (acionistas) teriam dinheiro para gastar. Se a frase fosse “os administradores preferiram reter lucros a distribuir aos acionistas, muito menos aos funcionários” faria sentido, mas certamente não era isso que o colunista queria dizer.
O foco no curto prazo na análise de ações pode ser um problema. A solução seria que os analistas focassem na criação de valor a longo prazo, que é o que realmente importa, e se precavessem dos métodos de “administração de lucros” e das fraudes que podem ser feitas. Passa também por entender que é contraproducente trocar a diretoria toda vez que os resultados ficam abaixo da expectativa, o que não me parece ser tão comum quanto alardeiam (embora, precisasse pesquisar sobre isso). A periodicidade da divulgação de resultados nada tem a ver com isso.