Marcas e Empresas
Valor presente com taxa real e com taxa nominal
Em outro texto, apresentei argumentos a favor da comparação de valores presentes no lugar da comparação de valores futuros. Dois exemplos utilizam taxas nominais e um usa uma taxa real. Qual está certo?
Para cálculos de valor presente, a taxa de variação do fluxo de caixa e a taxa de juros devem ambas serem ou taxas reais ou nominais, de forma a conservar a seguinte relação:
(1+ Taxa Nominal) = (1+Inflação)*(1+Taxa Real)
Essas taxas podem ser tanto taxas de juros (imagine o juro de um título pré-fixado de renda fixa e outro pós-fixado atrelado à inflação) quanto taxas de crescimento (se a receita cresce 6% em termos nominais e a inflação foi de 2%, o crescimento real foi de 3,92%).
Se um fluxo de caixa permanece constante no tempo (como nos três casos), então a taxa nominal de variação do fluxo é 0% e a taxa real de variação é de –Inflação%. Os fluxos nominais devem ser trazidos a valor presente pela taxa nominal e os fluxos reais devem ser trazidos a valor presente pela taxa real. Se as projeções forem consistentes, as duas abordagens devem ter o mesmo resultado.
Curiosamente, o que usou taxa real não precisava fazer isso enquanto que os dois que utilizaram taxas nominais deveriam ter feito alguma consideração sobre a variação de preços. O exemplo da aplicação mensal de R$ 180,00 não precisaria corrigir pela inflação, embora faça mais sentido corrigir, já que os R$ 180,00 foram calculados utilizando deixar de realizar um consumo de R$ 6,00 por dia. Mas seria possível uma pessoa se comprometer a economizar R$ 180,00 e aplicar esse dinheiro. O sacrifício seria cada vez menor, se os salários crescessem de forma a pelo menos compensar a inflação. Com o passar do tempo, o poder de compra de R$ 180,00 vai diminuindo e abrir mão desse valor se torna gradativamente menos frustrante.
Utilizar taxa real indica que o investidor irá aplicar sempre R$ 180,00 ajustados pela inflação acumulada. Supondo uma taxa nominal de 6% a.a., a inflação implícita é de 1,92% a.a. e 0,16% a.m. No primeiro mês, a pessoa iria aplicar R$ 180,29, no segundo R$ 180,57 e por ai em diante. Procedendo dessa forma, trazendo a valor presente esses fluxos de caixa à taxa nominal de 6% a.a. chega-se ao valor presente de R$ 38.030,71. Não coincidentemente o mesmo valor presente de fluxos de R$ 180,00 à taxa real.
A melhor abordagem nesse caso é utilizar valores nominais por ser mais realista. Utilizando valores nominais, sei que preciso arranjar uma aplicação que renda 6% a.a. (meta atualmente possível de se atingir), sei que preciso reajustar os R$ 180,00 originais pela inflação (cálculo simples de ser feito) e posso ir colocando esses valores em um fundo ou na poupança e ir capitalizando esse capital. O mesmo raciocínio não se aplicaria a um produto que renda uma taxa real.
O problema do celular (na infame versão de jogar fora o celular de R$ 1.000,00 todos os anos) deveria levar em conta a variação nos preços de alguma maneira. Daqui a trinta anos não sei como serão os celulares, nem se usaremos celulares. Seja como for, talvez por R$ 1.000,00 não consigamos comprar o que for de vanguarda, seja lá o que formos usar para nos comunicar. Mas isso é de menos. Deveria haver um ajuste dos preços pela inflação ou o uso de uma taxa real. Taxa nominal de 0% na variação dos preços dos celulares de vanguarda não é plausível. Um celular que hoje é moderno deverá valer menos no futuro, mas o equivalente modernizado de um celular de R$ 1.000,00 poderia valer mais do que isso.
Supondo que varie por 2% ao ano o preço dos celulares, a taxa real implícita é de 3,92%. O problema deve ser corrigido para evitar a absurda situação de uma taxa de crescimento nominal de 0%. Fazer isso, acrescentando uma taxa de crescimento de 2% a.a. e descontando pela taxa nominal, acentua-se a perda de valor presente, quem troca de celular a cada três anos e os jogando fora perdendo R$ 11.413,37. A conta utilizando fluxos constantes de R$ 1.000,00 quando há compra de celular, descontando pela taxa real, resulta no mesmo valor.
Ficou implícito no exemplo acima que a inflação é de 2%, igual à taxa de variação do preço do celular. Isso não é necessário. Se for suposta uma taxa de inflação de 1,5%, a taxa real de juros passa a ser de 4,43%. Os fluxos de caixa em termos reais, porém, não podem mais ser constantes. Se cresce a 2% e a inflação é de 1,5%, há um ganho real do reajuste de 2% no preço. Logo, deve-se calcular os preços ajustados pela inflação, utilizando 1,02/1,015 como multiplicador. O preço inicial de R$ 1.000,00 sofre um crescimento real de 0,49% e vai a R$ 1.004,93 no período 1, crescendo pela taxa de 0,49% em cada um dos próximos anos. Fazendo isso, os valores presentes são os mesmos da situação anterior com os ajustes (perda de R$ 11 mil para o vanguardista).
O mesmo deve ser feito para o caso dos cigarros, cujos preços devem variar com o tempo de forma a manter os preços relativos com outros produtos. Se os cigarros subirem de preço 0,15% todos os meses (que será a inflação mensal), o valor presente cresce para R$ 23.208,70. Mantendo o mesmo fluxo de caixa, supondo crescimento real de 0%, e ajustando a taxa para 0,35% a.m. real, o valor presente passa para R$ 23.208,70.
Feitas de forma coerente entre si, um cálculo de valor presente com taxa real e com taxa nominal devem ter o mesmo resultado. QED.
Essa planilha ajuda a acompanhar os cálculos.
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