Desafios da empresa individual limitada
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Desafios da empresa individual limitada


Após um longo período de debates, o ordenamento jurídico brasileiro incorporou a possibilidade de constituição de Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, a Eireli, pela promulgação, da Lei nº 12.441, de 11 de julho de 2011.

A adoção do novo instituto jurídico é o resultado de longa evolução que, gradativamente, ampliou o alcance da limitação da responsabilidade pelo exercício da atividade econômica. A sociedade limitada, por exemplo, foi criada na Alemanha no final do século XIX para permitir que o pequeno comércio tivesse acesso à limitação da responsabilidade que, até então, era reservada apenas aos grandes empreendimentos constituídos sob a forma de sociedades anônimas. No Brasil, a sociedade limitada foi introduzida no início do século XX e rapidamente se tornou o tipo societário mais adotado, conforme dão conta as estatísticas do Departamento Nacional do Registro do Comércio.

Muitas das sociedades limitadas registradas no Brasil são constituídas apenas para obter-se a limitação da responsabilidade pelas obrigações contraídas em razão do exercício de atividade econômica. Entretanto, para constituir-se uma sociedade limitada, é necessária a presença de pelo menos dois sócios. Assim, até a introdução da Eireli, quando um empresário pretendesse contar com a limitação da responsabilidade, havia a necessidade de encontrar um sócio para figurar no quadro social apenas como "sócio de palha".

A nova lei incentiva a pequena empresa a continuar adotando a sociedade limitada
Agora, com a criação da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, seria de se esperar que os pequenos empreendimentos deixem de adotar a forma de sociedade limitada. Entretanto, na nova legislação há um forte incentivo para a pequena empresa continuar a adotar a forma de sociedade limitada.

Para constituir-se uma Eireli, há a exigência de que o capital social seja de cem salários mínimos, isto é, R$ 54,5 mil em valores atuais. Este valor supera, em muito, o valor dos ativos empregados para a organização da maioria das pequenas empresas. Não é de se esperar, por exemplo, que o proprietário de um carrinho de cachorro quente empregue mais de cinquenta mil reais como capital social.

O incentivo legislativo continua sendo voltado para a constituição de sociedades limitadas, em razão do fato de que não há exigência legal de valor mínimo para o capital social. Pode-se constituir uma sociedade limitada com um capital de, por exemplo, R$ 3 mil.

Este não é o único incentivo contrário à adoção efetiva das Eirelis pelos pequenos empresários. Deve-se levar em conta, ainda, o tratamento tributário dispensado à empresa. Uma das principais razões pelas quais as pequenas empresas não adotam a forma de sociedades anônimas consiste no fato de que esse tipo societário não é beneficiado com as regras tributárias do Simples. Por isso, as pequenas empresas preferem adotar a forma de sociedade limitada. É para aproveitar as vantagens tributárias aliadas à limitação da responsabilidade que, nos Estados Unidos, muitas empresas preferem adotar a forma de limited liability company em detrimento da constituição de uma corporation. Até que se regulamente, no Brasil, de forma clara, a possibilidade de as Eirelis serem enquadradas no regime do Simples, continuará em muitos casos a ser mais vantajoso constituir-se sociedade limitada.

Por outro lado, a Eireli pode vir a ser tornar importante instrumento na organização de empreendimentos de maior porte. De acordo com a previsão da Lei 12.441, de 2011, a Eireli poderá ser constituída "por uma única pessoa titular da totalidade do capital social", e a "pessoa natural que constituir empresa individual de responsabilidade limitada somente poderá figurar em uma única empresa dessa modalidade". Esta redação deixa margem para que pessoas jurídicas constituam não apenas uma, mas diversas Eirelis, para segregar os riscos de seus distintos empreendimentos.

Esse modelo de organização da empresa apresenta diversas vantagens. Em primeiro lugar, a segregação de uma atividade permite a redução de custos de financiamento e uma substancial melhoria na gestão dos distintos empreendimentos. Além disso, é dispensada a necessidade de se encontrar um sócio para constituir uma sociedade, limitada ou por ações, com propósito específico. Até a institucionalização da Eireli, a única possibilidade de segregar um empreendimento sem a necessidade de um sócio era por meio da constituição de uma subsidiária integral, de acesso restrito às sociedades por ações. Agora, esta possibilidade é também alcançada às sociedades limitadas, que poderão constituir-se como holdings de uma constelação de Eirelis, cada uma das quais responsável por uma determinada atividade.

A Eireli foi pensada para o pequeno empresário pessoa física, mas, ao que parece, servirá à grande empresa societária. Ao invés de servir à limitação da responsabilidade do empresário individual, a Eireli poderá ser utilizada como instrumento para a organização de empresas plurissocietárias, como instituto jurídico capaz de pode contribuir fortemente para o desenvolvimento econômico nacional.
Cássio Cavalli é professor de direito da empresa da Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getulio Vargas (FGV-Rio)

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
Fonte:valoreconomico01/09/2011



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