Marcas e Empresas
O Poder da Voz
|
O poder da voz: JOOR ZAH FRUL |
(The Power of Voice: Managerial Affective States and Future Firm Performance)
William J. Mayew e Mohan Venkatachalam
Journal of Finance. Volume 67. Ed. 1. 2012
Tecnologias recentes vêm ajudando a realização de diversas pesquisas, inclusive a respeito do mercado financeiro. Uma ferramenta do Google foi utilizada para medir como a atenção dos investidores pessoa física afeta o comportamento dos ativos (ver aqui) e no artigo de Mayew e Venkatachalam os autores utilizaram um software de Leyered Voice Analysis (LVA) para examinar a voz dos executivos nas teleconferências de divulgação de resultados e procurando relacionar isso com o comportamento do mercado e dos analistas. Mais especificamente, os autores analisaram a seção de resposta aos questionamentos de analistas, por entenderem que é nessa parte da teleconferência que o estado emocional dos executivos poderá ser mais afetado e, portanto, mais revelador de informações. Estudos anteriores e também o senso comum indicam que sinais não verbais como atributos vocais, postura e gestos transmitem informações sobre a pessoa e sobre a mensagem que tenta passar. Em teleconferências de resultado, estados afetivos positivos podem transmitir sinais positivos com estados negativos tendo o efeito oposto, isso podendo se refletir no preço das ações, nas previsões de resultados e nas recomendações dos analistas.
Há diversas razões para examinar as teleconferências ao invés de outros eventos. O acesso à teleconferência ou a seus arquivos é fácil, nesses eventos os executivos (especificamente, diretor-presidente e diretor financeiro) podem ser questionados e, como não há vídeo, é possível isolar o efeito da voz. O software utilizado foi o da Nemesysco. Através desse programa, é possível examinar a voz em diversos aspectos, inclusive para detectar mentiras, mas o foco dos autores foi examinar a cognição em busca de dissonâncias cognitivas (discordâncias entre crenças e atitudes) e a emoção/ânimo. A eficácia desse software ainda não é definitiva e diversos testes anteriores mostraram que nem sempre os resultados foram bons, especialmente em detecção de mentiras, de forma que esse é um estudo conjunto do software e das hipóteses dos autores.
As teleconferências foram obtidas em uma base de dados da Thomson Reuters e são todas do ano de 2007 (algumas referentes ao último trimestre de 2006). Há algumas limitações na base, como o fato dos arquivos ficarem guardados apenas por um curto período de tempo (no máximo um ano) e não poderem ser baixados, o que dificultou uma pesquisa mais extensa. Após exclusões por motivos diversos, a amostra final possui apenas 1.647 observações de 691 empresas. Os arquivos são analisados quando é possível separar as falas do diretor-presidente e do diretor financeiro, havendo um período inicial para calibrar o programa e depois sendo utilizado para análise a parte de perguntas e respostas.
As estatísticas descritivas mostram que em aproximadamente 11% do tempo os executivos demonstram reações positivas acima do normal, enquanto que as reações negativas representam aproximadamente 18% do tempo. Outras variáveis serão incluídas na análise para poder controlar por outros efeitos que podem explicar os resultados além das reações afetivas implícitas na voz dos participantes da teleconferência. As empresas da amostra são em sua maioria grandes, com o valor dos ativos mediano sendo de US$ 1,2 bilhões, receita mediana de US$ 213 milhões e valor de mercado mediano de US$ 1,3 bilhões. Executivos de empresas com menos receitas, menos lucrativas e mais voláteis registraram mais reações negativas. Ou seja, parece haver dissonâncias cognitivas entre a crença na própria habilidade e o desempenho (lucratividade) da empresa e entre a ilusão de controle sobre os rumos da empresa e a sua imprevisibilidade (maior em empresas menores e mais voláteis).
Nas análises multivariadas por regressões múltiplas, o retorno anormal (controlando por tamanho e Valor Patrimonial / Valor de Mercado à Fama e French (1993)) é a variável dependente, com as variáveis independentes principais sendo as reações positivas e negativas, a contagem de palavras positivas e negativas, o desvio do lucro efetivo em relação ao esperado, além de outros fatores. Os resultados mostram uma relação positiva entre reações afetivas positivas e o retorno da ação, enquanto que o inverso ocorre com as reações negativas, consistente com o esperado. Dessa forma, o mercado parece levar em conta as informações que os executivos transmitem involuntariamente através de sua voz, emoções positivas resultando em retornos superiores, e tensão resultando em retornos inferiores. Um segundo conjunto de especificações separa as reações afetivas em dois grupos, de acordo com o fato da empresa ter apresentado lucro melhor ou pior do que o esperado, aquelas que decepcionaram sendo classificadas como "de alto escrutínio" (já que os analistas farão mais perguntas quando os lucros vêm abaixo do esperado). Para situações de alto escrutínio, o efeito das reações positivas é um pouco menor, mas o impacto das reações negativas é muito maior. Quando os lucros que serão comentados na conferência vêm melhor do que o esperado, a reação a emoções positivas é maior do que na outra situação, enquanto que reações negativas não produzem nenhum efeito estatisticamente significativo.
A próxima questão é sobre como o estado emocional dos executivos afeta o comportamento dos analistas. Foram examinadas as mudanças nas previsões de lucros e as mudanças na recomendação dos analistas. Não foram encontradas evidências de que reações positivas ou negativas tenham qualquer efeito nas previsões de lucros, e apenas as reações positivas quando a empresa deixa de cumprir as expectativas de lucro mostram algum efeito positivo na recomendação dos analistas. O interessante é que não há efeito das reações negativas, os autores interpretando esses resultados como consequencia da relutância dos analistas em rebaixar as suas recomendações (como constatado por O`Brien et. al. (2005)).
Em seguida, os autores analisaram se os sinais vocais possuem algum poder preditivo quanto ao desempenho futuro da empresa. Especificamente, a análise é sobre a reação afetiva na teleconferência e o desvio da expectativa de lucros nos trimestres seguintes. Não foi constatado efeito significativo para o trimestre seguinte, mas sim para dois trimestres à frente, tanto quando o sinal é positivo, quanto quando é negativo, mas apenas nas situações de alto escrutínio. O interessante é que as contagens de palavras positivas e negativas não mostraram poder explicativo, indicando que a sinalização não está no que foi dito, e sim em como o foi.
Outro efeito no mercado seria nos retornos de longo prazo, já tendo sido identificado o impacto das reações afetivas no curto prazo. Com análises semelhantes ao que vinha sendo feito nas partes anteriores do artigo, os autores examinaram os retornos entre dois dias após a teleconferência (ou seja, desconsiderando o efeito de curto prazo já estudado) até 180 dias após o evento. Apenas as reações negativas em situações de alto escrutínio mostram-se significativas nessa análise, as três outras situações não parecendo ter efeito sobre os retornos de longo prazo. Além desses fatores, um dos dois fatores do modelo de Fama e French (1993) se mostrou significativo, que foi o Valor Contábil/Valor de Mercado, mas não o tamanho. O quarto fator do modelo expandido, momentum, também se mostrou eficaz. Novamente, as contagens de palavras positivas e negativas se mostraram irrelevante. Uma das explicações para apenas a reação afetiva negativa ter efeito nos retornos é a falta de mudança nas recomendações de analistas com as más notícias. Os autores colocam uma ressalva sobre o uso dessas evidências para a montagem de estratégia de investimentos, notando que após considerados os custos de transação esse retorno anormal poderá desaparecer (mas não oferecem evidências de que assim seja).
Os autores realizam análises adicionais para melhor examinar os resultados encontrados. Primeiro, validam o LVA através de outros programas que podem ser utilizados para examinar a voz. Há alguma correlação entre os resultados do LVA e dos modelos alternativos, principalmente para reações negativas. Os valores para reações positivas e negativas são previstos pelos modelos alternativos e os valores previstos são utilizados para examinar os retornos no curto prazo. Outra análise adicional é sobre o comportamento das empresas após a teleconferência quanto à emissão de fatos relevantes positivos ou negativos (definidos de acordo com a reação do mercado à sua divulgação). Quando os executivos mostram reações positivas na teleconferência, em situações de baixo ou de alto escrutínio, há a menor probabilidade da empresa emitir fatos relevantes negativos, embora não haja relação significativa para reações negativas. Novamente, as contagens de palavras se mostraram irrelevantes. A próxima análise foi sobre a probabilidade dos analistas revisarem suas recomendações, sendo menor quando os executivos transmitem sinais vocais negativos, principalmente em situações de alto escrutínio. Como provavelmente a revisão seria negativa, isso dá suporte à ideia de que os analistas são relutantes em rebaixar suas recomendações. Pode ocorrer de os analistas não divulgarem recomendações desfavoráveis publicamente, mas que o façam em privado com clientes institucionais. Não foi constatado que a probabilidade de emitir análises desfavoráveis após reações negativas seja diferente quando a empresa possui alta ou baixa participação de investidores institucionais.
Por fim, os autores examinam se características do diretor-presidente poderiam explicar os resultados. Talvez executivos mais velhos possam simular reações positivas e apenas os mais novos que deixariam transparecer desconforto. Nem idade nem duração do mandato afetam os resultados da análise dos retornos no curto prazo.
Esse estudo é muito interessante por mostrar como sinais tão sutis como o tom da voz dos executivos durante teleconferências transmitem informações relevantes que são analisadas por investidores e analistas, mesmo que não utilizem nenhum programa de computador para isso. E também mostra como novas tecnologias estão sendo utilizadas para pesquisa científica e, possivelmente, para pesquisa comercial (a Nemesysco certamente adoraria vender alguns programas para analistas
loading...
-
O Que Move Os Preços De Ações?
Um artigopublicado na Financial Analysts Journaldiscute a questão sobre se o preço das ações se move por causa de fundamentos ou por outro fator, como o “reconhecimento” dos investidores. Algumas ações podem receber mais atenção dos investidores...
-
Relações Com Investidores E Preço Das Ações
(Selective Publicity and Stock Prices) David H. SolomonJournal of Finance. Volume 67. Nº 2. 2012. O artigo de Solomon estuda a relação entre a publicidade da empresa e o comportamento de suas ações, com foco em como empresas de relações com investidores...
-
Retornos E Atividade Dos Investidores
(Do Investors Trade More When Stocks Have Performed Well? Evidence from 46 Countries)John M. Griffin, Federico Nardari e René StulzReview of Financial Studies. Volume 20. Ed. 3. 2007 É bastante comum relacionar quedas no valor das ações como uma das...
-
Vendas A Descoberto E Delitos Financeiros
(Short Sellers and Financial Misconduct)Jonathan Karpoff e Xiaoxia LouJournal of Finance. Volume 65. 2010 Como escrevem os autores no começo do artigo, venda a descoberto é uma atividade controversa. Por um lado, alegam que amplia o universo de escolhas...
-
Eficiência De Mercado, Retornos De Longo Prazo E Finanças Comportamentais
(Market efficiency, long-term returns, and behavioral finance)Eugene FamaJournal of Financial Economics. Volume 49. 1998. Eugene Fama é o autor mais importante na literatura da hipótese de mercados eficientes (HME), com diversos artigos importantes...
Marcas e Empresas