Marcas e Empresas
Eficiência de mercado, retornos de longo prazo e finanças comportamentais
(Market efficiency, long-term returns, and behavioral finance)
Eugene Fama
Journal of Financial Economics. Volume 49. 1998.
Eugene Fama é o autor mais importante na literatura da hipótese de mercados eficientes (HME), com diversos artigos importantes e com suas definições de mercado eficientes sendo muito utilizadas. Nesse artigo, ele expõe o seu julgamento sobre estudos de anomalias de mercado que sugiram nas últimas décadas.
O artigo começa analisando os resultados de pesquisas anteriores sem ainda questionar as metodologias empregadas. Os estudos podem indicar excesso de reação a algum evento, com retornos de curto prazo expressivos seguidos de desempenhos baixos de longo prazo, ou subreação, com retornos fracos no curto baixo e expressivos no longo prazo. No primeiro caso, encontram-se estudos que revelam que ações antigas vencedoras se tornam novas perdedoras e vice-versa, empresas que realizam ofertas subsequentes têm lucros fortes antes da oferta e há um excesso de reação que resulta em retornos abaixo do mercado após a oferta e ações que se listam em outra bolsa dos Estados Unidos têm um desempenho inferior no longo prazo. Exemplos de reações iniciais tímidas são retornos anormais de empresas quando do anúncio de lucros, empresas que desinvestem e para as empresas que nascem desse desinvestimento e retornos anormais após desdobramento das ações. Outras são difíceis de classificar, como o retorno anormal baixo de empresas que adquirem outras (seria um excesso de reação pelo desempenho da empresa ou reação tímida a uma má decisão de investimento) e retornos anormais negativos em empresas envolvidas em guerras de Proxy (reação fraca ao mau desempenho ou excesso de expectativas sobre eventuais mudanças?). A crítica de Fama a essas evidências é que parece haver tantos casos de excesso quanto há de reações tímidas e que muitas dessas anomalias surgem simplesmente porque diversas tentativas são feitas. Com isso, não é possível descartar que excesso ou falta de reação seja resultado do acaso (coerente com a HME).
Não há uma teoria alternativa que explique melhor do que a HME porque há essa mistura de reações sem uma tendência clara. O autor mostra dois modelos desenvolvidos para tentar explicar essas reações de preços. Um incorpora o viés de representatividade e o conservadorismo (os investidores dão mais peso a eventos recentes e reagem conservadoramente) e o outro excesso de confiança e auto-atribuição (os investidores informados confiam muito em sua informação privada e consideram menos as informações públicas). Os modelos funcionam bem para os casos que foram criados para explicar, mas não explicam bem outras das anomalias identificadas (as previsões desses modelos não são coerentes com as evidências encontradas). No referencial da HME, os retornos anormais esperados são nulos, com desvios aleatórios para positivo ou negativo, que é o que parece ocorrer com esses estudos de eventos.
Em seguida, o autor passa a questionar os resultados obtidos pelos estudos. Mesmo que a probabilidade de excesso ou de falta de reação for a mesma, se os resultados forem expressivos, a HME ainda estaria em xeque. O autor argumenta que muitos dos resultados obtidos na literatura podem ser exagerados por “problemas de maus modelos” utilizados para analisar os eventos. A primeira questão apontada é que testes da HME devem ser feitos em conjunto com um modelo de precificação de ativos, em especial para resultados de longo prazo. Um retorno é normal ou anormal (explicável ou não explicável, apenas compensando o risco ou compensando demais ou de menos) segundo um modelo de precificação de ativos. A qualidade do teste está relacionada com a qualidade desse modelo e é possível encontrar anomalias espúrias ao utilizar falhas do modelo de precificação. Um exemplo é que o CAPM não explica o retorno de ações de baixa capitalização (ou um grupo de ações composto primordialmente por pequenas empresas) e usar o CAPM para analisar essas ações resultaria em anomalias espúrias. E nenhum modelo descreverá perfeitamente o retorno das ações, de forma que não se sabe se eventuais anomalias são falhas da HME ou falhas do modelo. Outros problemas são a escolha da janela temporal e, no caso de comparação com firmas semelhantes, definir parâmetros que captem as diferenças entre as empresas que participam de um evento (fazem ou não oferta subsequente, por exemplo).
A forma como os retornos são medidos também influencia os resultados. Apesar de fazer sentido, calcular retornos anormais na forma Comprar e Segurar (Desempenho anormal do grupo de estudo – Desempenho Anormal do Controle), o autor aponta alguns problemas. Basicamente, o BHAR (Buy-and-hold Abnormal Return) é o cálculo de retornos entre duas datas distantes no tempo (cinco anos, por exemplo). Porém, os resultados com periodicidades mais curtas (mensal, por exemplo) apresentam melhores resultados e os testes de modelos de precificação de ativos também são feitos com dados mensais. Outro problema é matemático: suponha um retorno anormal de 10% em um ano e nenhum retorno anormal nos quatro seguintes. Em cinco anos, sem nenhum outro retorno anormal, o BHAR seria de 20% (1,1*2 – 1,0*2). Por fim, utilizar a média simples ou geométrica dos retornos anormais (a melhor abordagem segundo Fama, embora também imperfeita) produz menos problemas estatísticos do que o BHAR.
A última questão passa a ser sobre a forma de ponderar os retornos, se de forma igual ou ponderada pelo valor. Ponderar por valor é mais preciso porque dá uma melhor noção do efeito dos retornos no patrimônio dos investidores. Acaba por reduzir os retornos anormais e diminui a influência das ações de baixa capitalização. Seria possível argumentar que o efeito dessas ações é uma previsão geral dos modelos comportamentais, mas nenhum dos dois modelos comportamentais apresentados no artigo faz essa previsão.
O artigo termina com uma análise de diversos estudos com base nessas questões de má modelação. Isso inclui estudos sobre IPOs e ofertas subsequentes, fusões e aquisições, desdobramento de ações, recompra de ações, mudança de bolsa de valores, iniciação ou omissão de dividendos, spinoffs e disputas por procuração de votos. Com algumas mudanças metodológicas como ponderar por valor, utilizar outro modelo de precificação ou não utilizar BHAR as anomalias somem ou se tornam muito menos significativas em termos estatísticos e econômicos.
A HME é tão perfeita quanto qualquer teoria pode ser, ou seja, não é perfeita. A questão é que não basta apontar deficiências na HME, é necessário apontar alternativas. Poucas alternativas surgiram para explicar o movimento dos preços dos ativos e o desempenho dos ativos e dos investidores e nenhuma se mostrou melhor, de forma que teremos que nos contentar com a HME por mais algum tempo.
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