Marcas e Empresas
Queda de braço entre as bolsas de energia no Brasil
A tecnologia de bolsas de valores está chegando ao setor de energia brasileiro. Os contratos de compra e venda no mercado livre, ambiente no qual grandes consumidores podem escolher seu fornecedor e negociar preços, ganhou duas plataformas virtuais no Brasil desde julho: a Brix e a BBCE. As duas novatas nasceram com a ambição de ser uma bolsa de energia e transformar contratos em derivativos financeiros, como acontece com ouro ou petróleo.
A primeira a chegar foi a Brix, que começou a operar no fim de julho do ano passado. A empresa tem como acionistas quatro empresários brasileiros, entre eles o bilionário Eike Batista, e a Intercontinental Exchange (Ice), uma das líderes globais no mercado de derivativos e dona do contrato Brent, de petróleo.
Mas a Brix ficou sozinha por pouco tempo. A BBCE - sigla para Balcão Brasileiro de Comercialização de Energia - é uma sociedade entre 13 comercializadoras de energia brasileiras e entrou em operação em 29 de fevereiro.
Elas querem trazer para suas plataformas parte dos contratos de energia de grandes consumidores. Hoje, esses negócios ainda são fechados por telefone. Mas o montante já é significativo e as bolsas querem ganhar com a cobrança de taxas e emolumentos pelas operações.
O mercado livre movimentou em 2011 cerca de 15 mil megawatts (MW) médios por mês, algo como 27% do consumo de energia no Brasil. Esses contratos representam um volume financeiro de R$ 20 bilhões, segundo estimativas do presidente da consultoria de energia Andrade & Canellas, João Carlos Mello.
Mas a maior parte do negócio ainda não está na bolsa. A Brix negociou em fevereiro 1.316 MW médios. Já a BBCE fechou 200 MW médios até agora, mas quer chegar ao fim do ano com volume mensal de 2 mil MW médios.
Esse montante é só a ponta do iceberg para executivos das duas bolsas. Os contratos no Brasil são negociados em média 2,5 vezes antes de serem executados. Em mercados maduros, são feitas de sete a dez transações.
O que torna viável o maior volume de negociações é a presença de agentes do mercado financeiro. No exterior, os contratos de energia permitem a liquidação financeira (em vez de receber entrega física de energia, o comprador recebe dinheiro no fim do contrato) e uma câmara de compensação assume o risco do negócio. No Brasil, as operações têm entrega física de energia e o risco é bilateral. Assim, se o comprador não pagar, o vendedor não recebe.
Corrida. Se depender da vontade da Brix e da BBCE, esse cenário deve mudar em breve. As duas pretendem definir este ano se vão criar uma câmara de compensação ou se associar a uma já existente para serem bolsas efetivamente. Para a Brix, uma das possibilidades é criar uma subsidiária brasileira para uma das cinco câmaras de compensação da Ice.
Já a BBCE admite que poderá fazer parcerias com outras bolsas. 'Já fomos procurados pela BM&FBovespa e por três bolsas estrangeiras interessadas em entender nosso negócio', disse o presidente da BBCE, Flávio Cotellessa. A BM&FBovespa não quis comentar a questão.
Espaço. Tanto a Brix quanto a BBCE dizem ter como meta se transformar na principal plataforma de negociação de contratos de energia. Mas especialistas no setor ainda têm dúvidas se há espaço para duas bolsas.
'A experiência internacional é que as bolsas coexistem por um tempo. Mas, depois, a que tem maior liquidez vai prosperar', disse o presidente da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia (Abrace), Paulo Pedrosa, sem arriscar sua favorita.
Modelos de negócios diferentes podem se mostrar acertados para uma ou outra empresa. A Brix aposta na experiência e tecnologia da Ice.
'Nossa plataforma já fez transações com trilhões de dólares em dez anos. Só em tecnologia, a Ice tem uma equipe de 650 pessoas', diz Marcelo Mello, presidente da Brix.
Já a BBCE desenvolveu uma plataforma própria, em parceria com a Paradigma, líder em negócios eletrônicos no Brasil. 'O nosso sistema foi customizado para atender a realidade brasileira', diz Cotellessa.
Outra vantagem da BBC em relação à Brix, segundo o executivo, é que ela é uma empresa 'de mercado para o mercado'. A BBCE já tem 13 comercializadores de energia como sócios e quer chegar a 60. Os acionistas são livres para negociar em outra bolsa, mas a tendência é concentrar a operação na BBCE.
Já Marcelo Mello, da Brix , afirma que a independência é até um diferencial. 'Nosso modelo é de isenção. A associação com membros que operam no mercado de energia pode criar conflito de interesse.'
Mas, para especialistas, o que fará com que uma bolsa prospere sobre a outra é alta liquidez e índices de preços confiáveis. As duas sabem disso e colocam essas questões como prioritárias. A Brix já lançou seu índice e a BBCE aguarda ter um volume maior de operações para fazer o mesmo.
O índice de preços vai ser a base para o mercado de derivativos de energia. 'A tendência é que os bancos se aproximem do mercado de energia assim que ele amadurecer', disse o presidente da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel), Reginaldo Medeiros. No Brasil, o BTG Pactual e o Pátria Investimentos já adquiriram fatias de comercializadoras.
Enquanto o mercado não se define, consumidores e geradores de energia avaliam as duas alternativas. A Braskem, por exemplo, está cadastrada na Brix, mas também ingressará na BBCE, disse André Gohn, diretor de energia da empresa. Em qual delas vai operar? Depende da qual tiver as melhores oportunidades. Por MARINA GAZZONI
Fonte:estadao19/3/2012
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