Marcas e Empresas
NTN-B e imposto de renda
Em um blog, o autor analisa o efeito do imposto de renda no rendimento líquido das NTN-B, título público pós-fixado pelo IPCA, concluindo que se a inflação for muito alta o rendimento líquido real será negativo.
Algumas observações devem ser feitas sobre o texto, como o fato do autor não levar em conta como funciona o título (com pagamento de cupom semestral) e utilizar capitalização simples para definir o retorno real. Ainda assim, podemos dizer que o autor quis analisar um título de curto prazo, com vencimento inferior a 180 dias. Nesse caso, realmente a taxa líquida real é negativa.
Primeiro, vou explicar como é feita a precificação da NTN-B e depois analisar a situação posta. A metodologia de cálculo é explicada no site do Tesouro Direto, de onde podem ser obtidas estatísticas sobre preços, taxas e VNAs.
A NTN-B é um títulos pós-fixado que paga cupons semestrais de acordo com o IPCA. A taxa do cupom é de 6% a.a., ou 2,96% a.s. O cálculo da inflação e do valor do título leva em conta o valor nominal atualizado (VNA), de valor R$ 1.000,00 em 15/07/00 e atualizado mensalmente pelo IPCA do mês anterior (o VNA de 15/08 é atualizado pela inflação de julho, por exemplo).
Supondo uma compra de NTN-B com vencimento em 15/05/2011 no dia 14/05/2010, convenientemente um dia antes da definição do VNA. O preço de compra do título era de R$ 1.900,35, o VNA na data de liquidação, dia seguinte à compra (15/01/2010) era de 1868,916525 e a taxa real era de 5,48%. O fluxo de caixa desse título seguirá essa tabela:
Data; Cupom (% do VNA); dias úteis; Valor Presente do Cupom
15/05/2010; 0,0295630140987; 82;=B2/((1+$D$7)^(C2/252))
15/11/2010; 0,0295630140987; 208;=B3/((1+$D$7)^(C3/252))
15/05/2011; 1,0295630140987; 333;=B4/((1+$D$7)^(C4/252))
Vou colocar várias tabelas nesse formato. Para utilizar no Excel, basta usar o “Texto para Colunas” e separar por ponto-e-vírgula. D7 é onde a taxa está na minha planilha, podendo ser alterado. Cada tabela deve ser utilizada separadamente.
A forma de se chegar à taxa real é calculando o valor presente dos cupons da forma como está na tabela acima (quarta coluna). A soma do valor presente deve ser igual à relação Preço/VNA, nesse caso, 1,016819. Para chegar à taxa, basta calcular a TIR; no Excel, utiliza-se o Atingir Meta, igualando a soma da quarta coluna com 1,016819, alternando a taxa (no caso da tabela, a taxa está na célula O6). Às vezes, o Atingir Meta não é lá tão preciso. Para corrigir isso, basta calcular a diferença entre a soma do VP e a relação Preço/VNA e multiplicar por algum número (1.000, digamos). O Atingir Meta agora consiste em igualar a zero essa diferença, alternando novamente a taxa, aumentando em muito a precisão da ferramenta. Afortunadamente, a taxa encontrada é 5,48% (batendo com a taxa divulgada pelo Tesouro).
A tabela mostra a forma geral como os cupons serão pagos. Para calcular os cupons que serão efetivamente recebidos, basta multiplicar a taxa do cupom pelo VNA na data de pagamento do cupom. A nova tabela passa a ser:
Data; VNA; Cupom; dias úteis; Valor Presente do Cupom
15/05/2010; VNA em 15/05/2010;=0,0295630140987*B2; 82;=C2/((1+$D$7)^(D2/252))
15/11/2010; VNA em 15/11/2010;=0,0295630140987*B3; 208;=C3/((1+$D$7)^(D3/252))
15/05/2011; VNA em 15/05/2011;=1,0295630140987*B4; 333;=C4/((1+$D$7)^(D4/252))
Agora, o valor presente dos cupons deve ser igual ao preço do título para se chegar à taxa. Dessa vez, trata-se da taxa nominal.
Como esse título já venceu, é possível analisar a situação com dados efetivos:
Data; VNA; Cupom; dias úteis; Valor Presente do Cupom
15/05/2010; 1918,358499;=0,0295630140987*B2; 82;=C2/((1+$D$7)^(D2/252))
15/11/2010; 1950,762408;=0,0295630140987*B3; 208;=C3/((1+$D$7)^(D3/252))
15/05/2011; 2043,248566;=1,0295630140987*B4; 333;=C4/((1+$D$7)^(D4/252))
A taxa interna de retorno, igualando o valor presente dos cupons ao preço, é de 12,82%. A inflação média do período, implícita nos VNAs é de 6,92% ((2043,248566/1868,916525)^(12/16)), enquanto que a taxa de inflação implícita utilizando a taxa nominal e a taxa real do título era de 6,96% ((1,1282/1,0548)-1). A inflação efetiva e a inflação recebida no título não são idênticas porque a inflação varia no período, a inflação acumulada anualizada tendo sido de 8,15% a.a. em 15/05/2010, 5,28% a.a. em 15/11/2010 e, como visto, 6,92% a.a. em 15/05/2011. Outra questão faz com que as taxas difiram, a ser detalhado mais para frente.
A proteção contra a inflação pode ser vista no cupom. Em 15/05/2010, o cupom foi de R$ 56,71. Não houvesse inflação (ou seja, se o VNA em 15/05/2010 fosse igual ao de 15/01/2010), o cupom teria sido de R$ 55,25. A diferença porcentual entre o cupom recebido e o que seria recebido sem inflação é justamente a inflação.
Esses cálculos são feitos sem considerar o imposto de renda e as taxas da bolsa. Para considerar o imposto de renda, basta calcular o cupom líquido. A tributação sobre os cupons consiste em aplicar a alíquota de imposto de renda (conforme a tabela regressiva no tempo) ao valor do cupom e a tributação sobre o principal é a diferença do PU final (o VNA no vencimento) e o preço pago. Uma ressalva: para tributação, o que importa são os dias corridos, não os dias úteis. Em uma nova tabela:
Data; VNA; Cupom; dias úteis; Cupom após I.R.; VP Cupom Líquido
15/05/2010; 1918,358499;=0,0295630140987*B2; 82;=C2*(1-0,225);=E2/((1+$D$7)^(D2/252))
15/11/2010; 1950,762408;=0,0295630140987*B3; 208;=C3*(1-0,2);=E3/((1+$D$7)^(D3/252))
15/05/2011; 2043,248566;=1,0295630140987*B4; 333;=(0,0295630140987*B4)*(1-0,175)-(B4-1900,35)*0,175+B4;=E4/((1+$D$7)^(D4/252))
O valor presente do cupom líquido se calcula da mesma forma, assim como a TIR. Dessa vez, a TIR será o retorno nominal líquido do título e irá variar de acordo com a inflação. Nesse exemplo, o retorno foi de 10,37%. Com inflação de 6,92%, a taxa real líquida foi de 3,23%, bem menor do que os 5,48% brutos.
É possível mudar os valores para supor outra taxa de inflação, bastando alterar o VNA para representar outra taxa. Se a inflação tivesse sido de 40%, a tabela acima seria:
Data; VNA; Cupom; dias úteis; Cupom após I.R.; VP Cupom Líquido
15/05/2010; 2090,7362501906;=0,0295630140987*B2; 82;=C2*(1-0,225);=E2/((1+$D$7)^(D2/252))
15/11/2010; 2473,79249230933;=0,0295630140987*B3; 208;=C3*(1-0,2);=E3/((1+$D$7)^(D3/252))
15/05/2011; 2927,03075026;=1,0295630140987*B4; 333;=(0,0295630140987*B4)*(1-0,175)-(B4-1900,35)*0,175+B4;=E4/((1+$D$7)^(D4/252))
A TIR agora é de 39,65%, abaixo da inflação de 40%, logo, a taxa real líquida é negativa, mesmo que a taxa nominal bruta tinha sido de 48,13%. Note que a inflação implícita não é 40% a.a. (1,4813/1,0548 não é 1,4), e sim 40,43%. Me parece que a divergência seja uma pequena questão matemática. Aqui, a inflação é medida pela diferença nos VNAs, apurados mensalmente. Com inflação de 40% a.a., a diferença do VNA de 15/05/11 e o de 15/01/10 é de 156,62%. Anualizando elevando a 12/16 (já que se passaram exatos dezesseis meses entre os VNAs), chega-se a 40%. Porém, considerando os dias úteis, elevando a 252/333 chega-se a 40,43%. A diferença da taxa de inflação efetiva e a implícita pelas taxas de juros se dá por essa questão de convenções de conversão de taxas, me parece.
O que o autor deixou de notar é que isso é muito dependente do período de tempo. Não só pela redução na alíquota para 15% para aplicações acima de 720 dias. Conforme o tempo passa, a alíquota de imposto de renda passa a representar uma porcentagem menor considerando-se o tempo. Alíquota de 15% será igual a 15% do valor do cupom ou do principal em qualquer momento, mas seu valor médio em 2 anos será diferente do seu valor médio em 20 anos.
Considere essa sequencia:
Cupom = VNAn*0,0295630140987
Cupom = VNA0*((1+inflação)^n)* 0,0295630140987
Cupom Líquido = VNA0*((1+inflação)^n)* 0,0295630140987*(1-i)
Cupom Líquido = VNA0*((1+inflação)^n)* 0,0295630140987*((1-im)^n)
Sendo que:
((1-im)^n) = (1-i)
Onde:
n = Data de ocorrência do cupom
VNA0 é o VNA na data 0 e VNAn é na data n
i = Alíquota de imposto de renda
im = Alíquota de imposto de renda mensalizada
Quanto maior for n, menor será im. Em 1 ano, im é 15% e em 20 anos, im será de 0,70%. É como se ao invés de cobrar uma alíquota sobre o montante fixa no tempo, fosse cobrada uma alíquota mensal 0,70%, resultando nos mesmos 15%. Essa “alíquota mensal”, porém, varia no tempo, como visto.
Utilizando a NTN-B com vencimento em 15/05/2045, com inflação de 40%, a rentabilidade bruta foi de 49,04%, e a rentabilidade líquida foi de 47,42%, ou seja, agora acima da inflação, gerando taxa real líquida de 5,30%. Menor do que os 6,34% do título, mas ainda assim positiva para esse papel mais longo.
Ressalve-se que a proteção contra a inflação após o imposto de renda continua imperfeita. O cupom líquido em 15/05/2010 foi de R$ 47,90, menor do que o cupom bruto sem inflação e sem imposto (R$ 55,25). Com o tempo, o imposto de renda consome menor parcela do rendimento proporcionalmente ao tempo, conforme argumentado, e a proteção contra a inflação é aprimorada.
Uma maneira mais simples do que calcular você mesmo é utilizando a calculadora do Tesouro Direto. Para o título com vencimento em 2045, a data de compra é 14/01/2010, a data de vencimento 15/05/2045, o valor investido é 1.805,08, a taxa é 6,34 e a inflação 40. A taxa nominal bruta ficou em 49,07% e a taxa nominal líquida foi de 48,13%, ou seja, divergiu dos meus resultados. Não sei o motivo dessa divergência. Não considerei a taxa de negociação (0,10%), mas, considerando, resulta em taxa bruta de 49,03% nas minhas contas. Para o retorno líquido, eu não considerei a taxa de custódia, mas isso deveria fazer com que meus resultados fossem menores. O que sei de concreto é que os cupons estão com valores diferentes na calculadora e nos meus cálculos. Na calculadora, estão corretos a data inicial, o valor investido e a taxa, resultando em mesma quantidade de títulos (1) e em VNA inicial correto, na medida em que o cupom sem inflação é o mesmo nos dois casos (R$ 55,25). O cálculo do imposto de renda na rentabilidade líquida também não parece ser o problema, na medida em que minhas fórmulas batem com a da calculadora quando a inflação é zero. O problema foi a atualização do VNA, que influencia o valor do cupom. Na calculadora, o primeiro cupom foi de R$ 61,71, enquanto o meu era de R$ 61,81. Dividindo por R$ 55,25 (cupom sem inflação) e elevando a 12/4, chegamos à taxa de inflação utilizada para atualizar o VNA e definir o cupom. Com R$ 61,71, a taxa é de 39,34% e com R$ 61,81 e sem arredondar é exatamente 40%, e mesmo arredondando é 40,02%. Analisando o próximo cupom, na calculadora, o valor é R$ 73,12. Dividindo por 61,71 e elevando a 2 (12/6), chegamos à inflação de 40,40%. Indo de cupom a cupom, a inflação se alterna entre algo mais próximo de 39,34% para os cupons de maio e algo mais próximo de 40,40% para os cupons de novembro.
Provavelmente o erro é meu, mas não consigo encontrá-lo. Disponibilizo a planilha e agradeço quem puder esclarecer esse ponto. De todo modo, de duas maneiras diferentes constata-se que, apesar de no curto prazo uma inflação elevada corroer a rentabilidade real da NTN-B, esse efeito é bastante reduzido utilizando um título mais longo. 35 anos pode parecer um prazo grande demais. Utilizando a NTN-B que vence em 15/05/2017 na data 14/01/2010 (ou seja, prazo de 7 anos e quatro meses), a taxa bruta é de 49,40% (48,55% na calculadora) e a taxa líquida 45,52% (45,77%), ou seja, ainda acima da inflação. Claro que títulos mais longos possuem maior risco de mercado, mas, no que se refere à tributação, são mais eficientes do que títulos mais curtos.
Atualização: 28/11/11
Voltando à calculadora do Tesouro Direto, descobri alguns motivos de divergências com meus resultados. A principal questão é com o VNA, que eu atualizei convertendo a taxa anual em taxa mensal e que a calculadora converte utilizando o número de dias úteis. Isso pode ser constatado analisando uma NTN-B principal: um título comprado no dia 14/01/2010, com vencimento em 15/05/2010, ao preço de 1.868,92 (VNA oficial em 14/01/10), com inflação de 40% a.a. valerá 2.085,16 segundo a calculadora, o que é exatamente o VNA em 15/05 calculado com dias úteis, não com meses.
A minha suposição é a de que a taxa de inflação seria constante entre as divulgações de VNAs, mas até faz sentido supor que a inflação diária é que é constante. Também faria sentido usar dias corridos ao invés de dias úteis, já que inflação não descansa no fim de semana ou em feriados, o que só faria diferença em épocas de alta inflação. Alterando apenas isso em meus cálculos, a taxa bruta cairia para 48,88% e a taxa líquida para 47,42%.
Com essa modificação, o primeiro cupom seria de 61,64, contra 61,71 informados na calculadora. Arredondando a taxa semestral de cupom para exatos 2,96%, o cupom seria de 61,72. Mesmo com vários arredondamentos ou truncamentos eu não consigo chegar em 61,71. A divergência entre o meu cálculo e o da calculadora cresce com o tempo. Com isso, a taxa bruta iria para 48,89% e a líquida para 47,27%.
Resolvi pegar os valores de cupons conforme a calculadora e fiz os cálculos de rentabilidade como vinha fazendo. A taxa bruta é de 49,07%, o que bate com o informado, mas a taxa líquida é de 47,45%, contra os 48,13% informados na calculadora. Descontando a taxa de custódia (o que não vinha fazendo), a taxa líquida conforme minhas contas seria de 46,99%. Ainda não sei como chegar nesses 48,13%.
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