Marcas e Empresas
O Investidor Inteligente
O Investidor Inteligente (4ª edição revisada) – Benjamin Graham
Uma boa maneira de começar a falar sobre esse livro é com uma metáfora. Imagine-se um avô, muito bem sucedido em sua carreira, mas já aposentado há muito tempo. Ele conversa muito com seu neto, que resolveu seguir a mesma carreira do avô. São conversas absolutamente encantadoras, muito bem contadas e que transparecem uma notável capacidade de raciocínio. Porém, o fato do avô já estar aposentado deixou seu conhecimento desatualizado, logo, não conseguirá passar ao neto as teorias e práticas mais avançadas. Porém, o neto tem muito a aprender com seus conselhos sobre como as pessoas agem na profissão (que pouco mudam), como, em linhas gerais, ele deve proceder e também tem muito a aprender com o modo de raciocinar do avô.
O leitor não sairá da leitura do Investidor Inteligente com um conjunto de técnicas prontas (sequer quase prontas) para serem aplicados com grande sucesso ou como uma exposição da mais moderna teoria de investimentos. A última versão do livro é de 1973 e muito mudou de lá para cá. Para ficar só no campo das teorias, o CAPM era muito recente (1964), a discussão sobre mercados eficientes tinha apenas começado (1970), a avaliação de opções apareceu há pouco (1972), não havia o modelo APT (1974) e também não havia teoria da perspectiva (1979). A avaliação de empresas também não era tão avançada quanto é hoje. Que essas teorias hoje sejam válidas ou não, úteis ou não, pode-se discutir, mas que fizeram o nosso conhecimento sobre finanças avançar, isso certamente ocorreu.
Com essa defasagem de 36 anos do livro, é natural a desatualização, afinal, as ciências mudam ano após ano. Mas isso de maneira alguma desmerece o livro. Em 2049 (quando a primeira edição completar 100 anos), os hoje mais avançados manuais de investimentos estarão em sua quarta ou quinta reciclagem (tanto de conteúdo quando do papel em si), enquanto o Investidor Inteligente continuará a ser lido da forma como Graham o deixou em 1973 (acrescido de eventuais comentários).
Também, não era o intuito do autor fazer um conjunto de regras ou trazer a mais moderna teoria de investimentos (ou seja, ser um manual). O objetivo declarado é fornecer orientações sobre a formulação de uma política de investimentos baseado em princípios (que são bastante estáveis, fundamentando toda a evolução da teoria) e nas atitudes dos investidores (que se comportam de maneira parecida ao longo do tempo e em diferentes lugares).
Os primeiros sete capítulos são destinados a distinção entre o investidor e especulador (ainda prefiro outra definição de especulador) e sobre o delineamento, em linhas gerais, de uma política de investimentos defensiva ou agressiva (empreendedora). Há também boas análises históricas retroagindo até o século XIX.
O investidor defensivo, na concepção de Graham, é aquele que alia segurança com despreocupação. É um investidor mais passivo, o que significa, na definição apresentada no livro Moderna Teoria de Carteiras de Elton et al., que o investidor defensivo pouco incorpora suas previsões acerca os preços futuros dos ativos. A preocupação desse investidor é com a saúde financeira e o histórico de rentabilidade da empresa e que a ação seja negociada a preços razoáveis (ao impor essa última restrição, leva em conta alguma previsão sobre o futuro da empresa). Os resultados que devem ser esperados não devem ser muito diferentes dos esperados de um índice bem diversificado. Os critérios para se escolher as ações seguem alguns princípios econômicos, expostos de maneira implícita, mas suas formas particulares (P/L abaixo de 25, por exemplo) não devem ser seguidas religiosamente, antes, servem de exemplificação do raciocínio.
O investidor agressivo pode esperar retornos superiores aos esperados por um investidor defensivo, porém, correndo o risco de obter menos ou até perdas (assim como o investidor defensivo em ações pode ter desempenho pior do que se investisse apenas em renda fixa). Os capítulos 6 e 7 são dedicados às situações que Graham, à época, prognosticava como menos (capítulo 6) e mais (capítulo 7) promissoras. Novamente, o que vale é o raciocínio, não tirar do livro as boas e más situações sem um julgamento contemporâneo.
Os capítulos 8, 9 e 10 são dedicados a outros assuntos. O principal (capítulo 8) refere-se à relação entre o investidor e o resto do mercado, uma relação que, hoje como ontem, deve ser de muita ponderação por parte do investidor. A parte que diferencia valores contábeis e valores de mercado deve ser lida com cautela. Nada impede que os valores de mercado se distanciem muito e justificadamente de quaisquer valores contábeis.
O restante do livro, exceto os dois últimos capítulos, são relativos à análise de títulos e valores mobiliários. Essa parte deve ser lida em sua essência, não nas particularidades da época. A abordagem da taxa de capitalização, por exemplo, não é utilizada hoje em dia e um leve exame é suficiente para perceber as falhas dessa abordagem. Toda essa parte serve como exposição implícita de princípios e desenvolvimento de raciocínio, não como uma caixa de ferramentas.
O capítulo 19 sobre política de dividendos é mais uma questão de Finanças Corporativas do que Gestão de Investimentos, e uma discussão contemporânea seria preferível.
Quanto ao conceito de margem de segurança (capítulo 20), a parte de renda fixa já foi absorvida pela teoria de investimentos na forma das relações de cobertura de juros. A margem de segurança para ações na forma da relação Lucro/Preço, por outro lado, não foi. Mais de acordo com o conceito (margem de segurança como diferença entre o “poder do lucro” e rendimento da renda fixa) seria a idéia de prêmios por risco implícitos. Por fim, Graham relaciona margem de segurança e diversificação de maneira muito apropriada.
A utilidade desse livro não é ser uma caixa de ferramentas, mas ensinar a pensar os investimentos e os mercados, como delinear uma política de investimentos e como entender os princípios que movem as decisões de investimento.
O livro foi publicado no Brasil pela Nova Fronteira, com comentários de Jason Zweig.
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