Marcas e Empresas
Capital de Giro e Valor
Capital de giro é fundamental para uma empresa e para a avaliação de seu valor. Mas, surpreendentemente, poucos estudos analisaram a relação empírica entre capital de giro e valor. Um artigo publicado na Review of Finance procura preencher essa lacuna.
Segundo os autores do artigo, em média as empresas americanas mantém 27% dos ativos em capital de giro. Estudos anteriores analisaram aspectos isolados da gestão do capital de giro, mas faltava ainda uma abordagem mais integrada. Capital de giro está relacionado basicamente com a gestão das contas a pagar, dos estoques e das contas a receber, além do conceito de ciclo operacional, que começa na aquisição de matéria-prima e termina no recebimento das vendas.
A relação entre capital de giro e valor vem da própria forma como os fluxos de caixa futuros são estimados. A partir do lucro líquido (ou do lucro operacional após imposto de renda), deduz-se os investimentos em capital fixo e os investimentos em capital de giro para se chegar à estimativa de quanto sobra para a empresa remunerar os acionistas (e devedores, no fluxo de caixa da empresa). Então, quanto menos a empresa investir em capital de giro, melhor deveria ser, desde que fosse inconsequente investir pouco em giro. As consequências negativas de se manter um baixo capital de giro vão desde a falta de estoque (e consequente perda de vendas) até dificuldades financeiras. As condições de crédito aos clientes também influenciam o capital de giro, uma política muito generosa aumentando as vendas, mas atrasando o recebimento de receitas. Além do mais, há uma relação conjunta entre gestão de estoques e política de crédito. Na gestão do capital de giro (assim como do caixa), há a troca entre custo de oportunidade e custo de carregamento.
Os autores analisaram empresas americanas no período entre 1990 e 2006 utilizando a base CRSP, excluindo empresas financeiras. A metodologia envolve calcular o retorno anormal de uma ação em função de determinadas variáveis. O retorno anormal é o retorno da ação subtraído do seu índice de referência, que é o desempenho de uma carteira no mesmo grupo de tamanho e relação Valor Contábil/Valor de Mercado. Inicialmente, os autores utilizam as variáveis incluídas em Faulkender and Wang (2006), que são:
Caixa
Despesas com juros
Dividendos
Alavancagem (Dívida/Dívida + Ações)
Financiamento (Emissão de Ações – Recompra + Emissão de Dívida – Pagamento de dívida)
Lucro Operacional
Ativo Total
Gasto em P&D
Algumas variáveis definidas como variações, enquanto que outras pelo valor absoluta e outras ambas as especificações. Os valores são divididos pelo valor de mercado, para indicar a sua contribuição marginal para o retorno da ação.
Os autores incluem duas variáveis, relacionadas com o objeto de estudo do artigo, que são o capital de giro e sua variação. O ativo total sofre uma alteração, sendo o ativo total menos caixa, aplicações financeiras e capital de giro.
Os resultados mostram que US$1 investido em capital de giro gera valor de US$ 0,52. A interpretação desse resultado é: “empatar” capital de giro destrói valor e por isso que as empresas procuram reduzir o capital de giro necessário para manter as operações sem prejudica-las. Contrariamente, US$ 1 investido em caixa é valorizado pelo mercado como gerando US$ 1,50, ou seja, o mercado não pune a manutenção de dinheiro em caixa, resultado inclusive que era o tema do artigo de Faulkender and Wang (2006). A interação entre o nível de Capital de Giro e sua mudança é negativa e tem coeficiente de 0,16, indicando que em níveis médios de investimento em giro o valor marginal é reduzido em US$ 0,16 por dólar investido, estabelecendo uma contribuição marginal em função do tamanho do investimento em giro.
Com isso, determina-se que o nível do investimento em giro é um dos determinantes de sua contribuição para o valor da empresa, mas seria interessante entender se há outros fatores influentes. Os resultados mostraram que crescimento de vendas (média dos três últimos ou seguintes anos) influencia positivamente (investimento em giro é mais valioso quanto mais a empresa está crescendo), um resultado que faz todo sentido lógico. Na parte do financiamento da empresa, mais dívidas de longo prazo (mas não de curto) e maior risco de falência (medido pelo Z-Score de Altman) reduzem o valor marginal o investimento em giro. Ou seja, quanto pior for a situação financeira da empresa, menos valioso é o investimento em giro.
Na parte das restrições financeiras, o índice SA de Hadlock e Pierce (2010) mostra que empresas com maiores restrições veem seus investimentos em giro gerar mais valor. Já que provavelmente estamos analisando aqui empresas menores e mais jovens, faz sentido que o investimento em giro seja mais valioso para esse tipo de empresa. Testes adicionais mostram que é esse o efeito, e não a falta de acesso ao mercado de crédito. Variáveis macroeconômicas ou o ambiente financeiro não afetam a contribuição do investimento em giro, seja porque já impactam o retorno independente do capital de giro, seja porque apenas efeitos específicos à empresa é que importam. Basicamente, os resultados mostram que investimento em giro é mais valioso para empresas em crescimento e menos para empresas com dificuldades financeiras.
A próxima questão é sobre qual elemento do capital de giro mais contribuiu para o valor da empresa. Para examinar essa questão, a variação do capital de giro é desmembrada em seus três componentes. Os resultados mostram que US$ 1 investido em recebíveis (ou seja, estendendo as condições de crédito para os clientes) é mais valioso do que US$ 1 investido em estoque, embora a contribuição de ambos seja inferior a US$ 1. Talvez por isso que a gestão de estoque é uma questão tão mais debatida do que a gestão de crédito aos clientes.
Resumindo, o artigo quantifica a importância do investimento em giro e mostra a necessidade de uma gestão mais eficiente do capital de giro, em especial estoques, principalmente para empresas com dificuldades financeiras.
Working Capital Management and Shareholders’ Wealth
Robert Kieschnick, Mark Laplante e Rabih Moussawi
Review of Finance. Volume 17. Ed. 5. 2013
Quadro resumo:
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